Poucos lançamentos recentes condensam tão bem a tensão entre risco artístico e ambição industrial quanto “Uma Batalha Após a Outra”, épico de Paul Thomas Anderson estrelado por Leonardo DiCaprio que chega aos cinemas nesta quinta, 25 de setembro de 2025, cercado por elogios críticos e expectativas de bilheteria. Durante boa parte do seu longo desenvolvimento, são cerca de duas décadas de tentativas e reescritas, com idas e vindas na adaptação de “Vineland”, de Thomas Pynchon, o projeto foi tratado como uma aposta incerta: orçamento alto, temática politicamente inflamável, formato analógico em larga escala e um diretor conhecido por dramas mais intimistas do que por superproduções.
Hoje, porém, o cenário mudou: o filme desponta como forte concorrente ao Oscar 2026, com aprovação quase unânime nas primeiras críticas e um elenco que mistura estrelas veteranas e revelações.
O “grande risco”: orçamento robusto, ambição estética e um diretor fora da zona de conforto
O risco financeiro foi o primeiro fantasma a rondar o projeto. Estimado entre US$ 130 milhões e US$ 175 milhões, o orçamento coloca Anderson em um patamar raríssimo para cineastas autorais, especialmente quando o foco não é uma franquia, mas um thriller político que alterna presente e passado para discutir imigração, extremismo e colapso institucional. A filmagem em VistaVision, formato de altíssima definição mais caro e trabalhoso, acentua essa ambição estética. Em entrevistas e reportagens, a equipe reconheceu que, sem um lançamento robusto e boca a boca consistente, o filme poderia se tornar um caso clássico de “aposta de prestígio” que não encontra público suficiente.
Do bastidor à vitrine: a virada crítica que mudou o jogo
A “virada” começou nas primeiras sessões para a imprensa. Veículos internacionais e nacionais destacaram o alcance temático, o desenho de ação e a direção segura de Anderson em terreno novo para ele, além de atuações poderosas de DiCaprio, Sean Penn, Benicio del Toro e Teyana Taylor. O clima de entusiasmo refletiu-se em índices iniciais próximos de perfeitos em agregadores, alimentando a percepção de que a obra representa uma síntese rara entre vigor popular e densidade autoral.
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No Brasil, publicações como VEJA chamaram o longa de “um dos melhores do ano” e nome forte para o Oscar; internacionalmente, análises relatam uma recepção crítica “explosiva”, ainda que reconheçam divisões pontuais sobre o fôlego da narrativa no ato final, um tipo de debate que costuma cercar favoritos na temporada.
A estratégia de lançamento e o papel da bilheteria
Se o risco artístico diminuiu, o desafio comercial permanece central, e o próprio DiCaprio admitiu publicamente essa pressão. Às vésperas da estreia, o ator afirmou que a bilheteria é “muito importante” para o filme, ecoando a leitura do mercado de que produções originais e ambiciosas dependem de uma abertura sólida e sustentação nas semanas seguintes para se manterem competitivas na temporada de prêmios. Distribuído pela Warner Bros, o longa estreia exclusivamente nos cinemas e, se seguir o padrão recente do estúdio, deve chegar primeiro ao VOD antes de migrar para o streaming da casa, o que amplia a janela de conversa cultural, mas também aumenta o escrutínio sobre o desempenho inicial.
O filme: trama, temas e o “PTA” de grande escala
Na tela, “Uma Batalha Após a Outra” acompanha Bob Ferguson (DiCaprio), ex-revolucionário forjado no calor de ações diretas, que se vê obrigado a resgatar a própria filha enquanto fantasmas de 16 anos atrás voltam à tona e um antagonista carismático e fanático, o coronel Steven Lockjaw (Sean Penn) fecha o cerco. Anderson filma com vigor físico e ironia política, costurando perseguições, explosões e tiroteios com um comentário ácido sobre autoritarismo, teorias da conspiração e racismo estrutural, temas que conectam a distopia quase presente do filme às feridas abertas do agora.
A presença de Teyana Taylor (como Perfidia Beverly Hills), Benicio del Toro, Regina Hall, Alana Haim e a estreante Chase Infiniti reforça o tom de “coleção de personagens em órbita” tão caro ao cinema do diretor.
Da sala de montagem ao termômetro do Oscar
Com a recepção inicial calorosamente positiva e a promessa de abertura histórica para a carreira de Anderson no Brasil, a narrativa pública mudou: aquilo que parecia “grande risco” agora é observado como “aposta vencedora”. A temporada de prêmios, que se estende até o início de 2026, deve testar o fôlego do filme nas categorias principais (Filme, Direção e Ator), além de Ator Coadjuvante, onde nomes como Sean Penn já surgem em destaque. A confirmar-se a tração de bilheteria e a manutenção do entusiasmo crítico, “Uma Batalha Após a Outra” tende a consolidar-se como um eixo de conversa entre público, crítica e indústria, algo que projetos caros e originais precisam, mais do que nunca, para chegar vivos ao Oscar.
O que está em jogo para DiCaprio, e para o cinema de autor em larga escala
Para DiCaprio, o filme representa mais um capítulo de risco calculado: longe de franquias, mas perto de diretores que expandem seus próprios limites, ele assume um protagonista contraditório, de humor áspero e moralidade em fricção, um terreno que o ator domina e que costuma render indicações. Para Paul Thomas Anderson, a equação é ainda mais delicada: um “PTA” de grande escala que precisa provar que há público para blockbusters autorais com assinatura forte, em um mercado saturado por IPs.
Se a estratégia funcionar, o filme pode reabrir caminhos para orçamentos altos de estúdio ao redor de ideias originais, reforçando a noção de que o cinema adulto de prestígio pode, e deve disputar o centro do palco. Como o próprio DiCaprio sinalizou, cada ingresso conta: a bilheteria não é um fim, mas o meio para que mais obras assim possam existir.